domingo, 23 de junho de 2013

SEXO DO MÉDIUM E IDADE E OS GUIAS

   Aqui um exemplo de médium homem trabalhando com uma entidade Preta Velha,

                               

médium incorporado com preta velha Vovó Nhá Maria.
O trabalho mediúnico nesse caso, em nada interfere na orientação sexual da pessoa, haja vista,a maioria dos médiuns umbandistas são mulheres heterossexuais e elas incorporam guias masculinos( e isso não ¨modificou¨ seus comportamentos sexuais).
  O mantenedor desse blog(linhadooriente) tem como guia de frente uma preta velha.(apesar de não ser mediunidade de incorporação)
  Um outro fator que muita gente leiga pensa, é que pretos velhos e caboclos somente são incorporados por médiuns veteranos, maduros, com uma certa idade.
  Mas é muito comum ,e muito bom do ponto de vista de educação mediúnica que o médium, devidamente orientado e doutrinado, já trabalhe com preto velho desde jovem.

                                                    
medium adolescente incorporada com preta velha.


Existe preconceito e receio dentro da própria Umbanda sobre esses temas.

FONTE DAS FOTOS; www.casadepaitome.blogspot.com.br
   se as pessoas mostradas nas fotos não quiserem ser expostas aqui,mandem uma mensagem que as fotos serão devidamente retiradas.As coloquei aqui como informação ilustrativa.
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Muitos afirmam que se um médium homem trabalhar com uma entidade feminina isso pode levá-lo ao homossexualismo. Desta forma, alguns dirigentes de terreiros proíbem que os médiuns homens de suas casas trabalhem com entidades femininas tais como caboclas, baianas, pombas-gira.
Vamos analisar a questão partindo de linhas de pensamento racional :
1 - Se a caridade deve ser praticada e estendida a todo e qualquer espírito (carnado ou não), não se devem haver critérios limitantes de escolha e não tolher livre-arbítros.
2 - Por que uma médium pode incorporar um espírito masculino e não há limitação nisso ? Qual é a explicação lógica e racional para isso, já que se no caso contrário poderia haver uma potencialidade homossexual no médium homem? Há também homossexualismo feminino e isso não ocorre com uma médium que trabalhe com espíritos masculinos?
3 – Guias femininos existem tanto quanto os masculinos, assim como há tantos médiuns femininos quanto masculinos. Tais guias urgem trabalhar pela melhoria da comunidade que são-lhes responsáveis. Os guias já ultrapassaram limitações da materialidade, já limaram as arestas de seus comportamentos, já apuraram suas características de personalidade ao menos mais que nós ainda seres em processo de reencarne.
Seriam eles, esses luminosos guias, capazes de induzir algum médium, sob sua responsabilidade, a cometerem erros ou praticarem distorções em suas personalidades, desviando-se daquilo que foi planejado ?
Seriam esses guias tão preconceituosos quanto ao homossexualismo ao ponto de eles proibirem seus médiuns de serem homossexuais ?
Algum guia espiritual de fato incorporado já proibiu que médiuns homens incorporassem guias femininos ? Pensem...

4 – Um médium, seja homem ou mulher, tem seus corpos físico e espiritual capacitados para a manifestação mediúnica, seja em qual modalidade for necessária. Essa capacitação não está ligada aos pólos masculino ou feminino, mas sim aos chacras e plexos que farão as ligações energéticas entre médium e guia.
6 - Um guia tem seu grupo de médiuns para ajudar, para trabalhar com eles, em que ele é responsável e isso independe se os médiuns tem ou não o mesmo pólo masculino ou feminino que o guia.
7 - Os guias respeitam muito os corpos dos médiuns nos quais eles se utilizarão para se manifestar, entendem os aspectos físicos e suas limitações. Um guia só iria utilizar-se de um médium se este concedesse por livre arbítrio tal “empréstimo”, assim, não haveria obrigatoriedade neste intercâmbio espiritual.
8 - O fenômeno da incorporação traz ao corpo físico do médium, os trejeitos do guia, a forma com que o guia se manifesta, seu linguajar, sua capacidade de comunicação e toda a gama do modo de ser e agir do guia. Poderia aí, estar a causa de tanta preocupação de um médium masculino passar a ter os trejeitos de uma mulher quando um guia feminino o incorporasse. Entretanto a que se relevar que :
- os trejeitos são do guia e não do médium;
- após a desincorporação, o médium reassume seu corpo e suas faculdades voltam a se manifestar na íntegra sobre o seu corpo físico;
- nenhum guia iria expor ao ridículo médiuns pelos quais tem a responsabilidade de preservar;
- preocupados com a preservação de seus médiuns, os guias não iriam deixar que qualquer resquício energético nocivo ficasse sobre seus médiuns;
- guias como as crianças, também não tornam médiuns adultos, temporariamente, com trejeitos infantis ?
9 – As manifestações mediúnicas envolvendo médiuns masculinos e guias femininos não são tão raras como se pensa. Esses fenômenos apenas não são tratados com a devida naturalidade e respeito, onde é preferível que sejam evitados para não constranger aos preconceituosos.
Para concluir, após esses parcos argumentos, é preciso que haja a consciência de que a Umbanda é uma manifestação religiosa que liberta-nos de nossos equívocos através das demonstrações simples, descomplicadas e diretas da prática da caridade.
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sábado, 22 de junho de 2013

SIMIROMBA - MISTICA

Em Louvor a Francisco de Assis
Francisco,

Humílimo Irmão Sol,

Tu que fostes o Pobrezinho de Assis,
Santo dos desvalidos e sofredores,
Destra Caridosa da Divina Providência
Quando as trevas da Idade Medieval
Varria as terras humanas, espalhando medo, doença e fome.
Despojastes de ti mesmo, entregando-te ao exercício do Amor Cristão.
Sê para nós outros, este Guia e Modelo
De conduta digna e humana, com o qual devemos nos nortear.

Resplandecestes pelos estigmas com que o Cristo te marcastes!
Para dar testemunho e a coroação de tuas boas obras!
Sê o nosso farol, para que saibamos transpôr as nossas próprias dores, dificuldades e lamentações!
Conduz-nos aos campos da Natureza Divina, a qual tanto prezastes!
E com o laurel de flores que recebestes em sua Ascensão Espiritual,
Cinge-nos com as pequenas pétalas que exalam perfume de teu venerando coração!

Agradeço a ti, Francisco de Assis!
Sol brilha sem fim e aquece nosso ser!
Faze com que nós, tal qual flores primaveris,
Floresçamos para Vida Maior, entregando-nos ao Bem e ao Amor ao Próximo
Hoje, sem demora! E para todo o Sempre!
Para que o Amor e a Bondade que nosso olhos e mãos saibam manifestar
Dêem testemunho de ti, e Daquele em Quem estás!

És uma das Raízes do Céu!
És Simiromba! Homem Puro!
Francisco de Assis!

inspirada em 04/10/2012
Espírito: Salvador Meirigo
Medium: Gregorio Lucio
 
 

LINHA DE SIMIROMBA

SÃO FRANCISCO DE ASSIS E A UMBANDA DE SIMIROMBA
Ao ler sobre meu querido Mestre Francisco de Assis, descobri tantas coisas novas sobre ele, que vão além de tudo que já sabemos sobre sua vida desde Assis na Itália a partir de seu nascimento provavelmente em 1182, e na verdade muito tem a ver com o nosso Brasil de norte à sul.
Em 1982 foram comemorados os oito séculos do seu nascimento com lançamento de livros, um selo postal, salões de arte e celebrações religiosas. As três ordens, fundadas por ele, os franciscanos, as clarissas e a ordem terceira, manifestaram-se na ocasião.
São Francisco e seus frades estão muito presentes na história e na cultura popular.
Em Canindé (CE) está seu grande santuário que atrai anualmente muitos milhares de romeiros. Especialmente nas igrejas barrocas existem imagens bonitas do nosso santo, que é padroeiro dos escritores de cordel (desde 1975) e de todos os trovadores. A fé popular guarda histórias, rezas benditas e até pontos de Umbanda que falam de São Francisco. Umas quadras conhecidas:


São Francisco é meu Pai, Santo Antônio é meu irmão
Os anjos são meus parentes Ó que bela geração.
(Araçuaí. MG. 1979)


Viva São Francisco Com tanta grandeza
Retrato de Cristo É pai da pobreza.
(Salinas. MG. 1978)


Ó meu padre São Francisco Coluna da fortaleza
Assuspende o seu cordão Senão eu caio de fraqueza.
(Araçuaí. MG. 1977)


Ele está presente nos cantos de penitência na ocasião das secas. Também há quadras sobre ele nas folias de Reis e nos benditos da Semana Santa. São Francisco tem cantos de romaria e de simples devoção. Existem rezas que pedem sua ajuda para render e abençoar a comida, para amansar doidos e afugentar o demônio. Em alguns lugares é cantado o ofício popular de São Francisco (Conforme Cartilha da Doutrina Christã, de Antônio José de Mesquita Pimentel. Porto, 1871. pág.198ss.). Esta pequena introdução não mostra toda a riqueza da devoção popular para com São Francisco, mas é parte do contexto em que aparece o CORDÃO DE SÃO FRANCISCO.


• -(Artigo publicado na Santa Cruz. Nov/1982 e no Boletim da Comissão Mineira de Folclore. Ago/1986)


Mas neste conhecimento adquirido sobre Francisco de Assis, o que mais me chamou atenção foi descobrir que no início do século passado havia uma Linha de Umbanda que era chefiada pelo nosso São Chico, há registros em livros e inclusive conhecimento passado por pessoas mais antigas que conheceram os trabalhos de cura e de desobsessão nesta linha da Umbanda chamada de Linha Simiromba, que etimologicamente quer dizer Frade. Também conhecida como Linha dos Monges ou Linha de São Francisco de Assis. Nessa linha trabalham padres, freiras, monges e utilizam cânticos da Igreja e outras formas bem Católicas de trabalhar, misturados com uma mística medieval.

Esta linha de trabalho foi aos poucos desaparecendo das casas de Umbanda por motivos históricos, conforme relato abaixo:
É uma linha que se originou nas Macumbas Cariocas (As "macumbas" o que eram? mistura de catolicismo, feiticismo negro e crenças nativas - multiplicavam-se; tomou vulto a atividade remunerada do feiticeiro; o "trabalho feito" passou a ordem do dia, dando motivo a outro, para lhe destruir os efeitos maléficos; generalizaram-se os "despachos", visando obter favores para uns e prejudicar terceiros; aves e animais eram sacrificados, com as mais diversas finalidades; exigiam-se objetos raros para homenagear entidades ou satisfazer elementos da baixo astral. Conforme relatado no Livro Brasil Coração do Mundo Pátria do Evangelho, do Espírito Humberto de Campos psicografia do Chico Xavier, a Espiritualidade Maior já de olho em tudo que acontecia mandou seus emissários, para frear as maldades que estavam sendo feitas e com isso em 15 de novembro de 1908, Zélio de Moraes dá o pontapé inicial ao receber o Caboclo das Sete Encruzilhadas e fundar assim a Umbanda uma religião puramente nacional, que visava o bem, a cura, o intercâmbio mediúnico e o não sacrifício de animais.”) como a Umbanda não existia ainda por isso antes de Zélio, e existem relatos em um dos livros do Arthur Ramos e ou do Nina Rodrigues Mbanda ou Embanda (que posteriormente se transformou em Umbanda após e continuou pluralizada em vários tipos e formas de trabalhos).
Com o passar do tempo essa linha foi sendo deixada de lado e o que se encontra hoje são referências místicas e esotéricas como as do "Vale do Amanhecer" (Tia Neiva mentora física e hoje também espiritual), cabe aqui explicar que Francisco de Assis nesta linha de trabalho é conhecido como Pai Seta Branca, que é o líder da doutrina do Vale, e segundo Tia Neiva em uma das vidas passadas Francisco viveu como um indígena, próximo ao Lago Titicaca, entre o Peru e a Bolívia.Por isso a caracterização indígena e o nome Seta Branca, que também é conhecido como Simiromba de Deus ou Simiromba do Grande Oriente de Oxalá.
A Linha de Simiromba dentro do sincretismo afro-católico, seria uma Linha de Trabalho ligada a Oxalá (onde inclusive trabalham diversos outros santos da linha católica) e tida como cura, desobsessão, retirada de elementos negativos (por isso começaram a trabalhar na época das “macumbas”, pois os trabalhos de feitiçaria para o mal predominavam, e segundo relatos esta linha chefiada por São Francisco de Assis é exímia em trabalho de desmanchar magias negras, feitiçarias e desobsessões, além da cura.
O trabalho era feito com rezas, velas, incenso, e trajes característicos (hábito de monje e de freira), e tinha toda uma mística esotérica envolvida (talvez por isso começaram a atuar mais no Vale do Amanhecer). Creio particularmente que também isso se deu com a própria criação da Umbanda que através de outras linhas de trabalhadores como os Pretos Velhos, Exus, Erês (crianças) e os próprios Orixás e seus Falangeiros quando chegaram ao plano físico assumiram, digamos assim, a limpeza dos “trabalhos sujos”.
Uma realidade muito cruel de discriminação e preconceito, aconteceu com a institucionalização da Umbanda e na migração de muitos Espíritas para o meio Umbandista nos anos de 20, 30 e 40 do século XX, e que culminou também com a realização do Pacto Áureo, como forma de proteção ao Espiritismo Doutrinário.
Muitos Espíritas descontentes com a forma de trabalhar do Espiritismo Doutrinário ou Ortodoxo migraram para a Umbanda, dita como "Umbanda Branca" (juntando o trabalho de mesa com o trabalho de guias, como: Caboclos e Preto-Velhos) . Mas, ao mesmo tempo, houve uma discriminação de trabalhos que eram feitos antes da institucionalização da Umbanda, que eram feitos nas antigas Macumbas e que eram considerados como não evoluídos (isso atingiu a Linha de Simiromba e outras linhas tidas como Africanizadas) .
Houve uma hipervalorização de duas formas de trabalho: a da Linha Branca Espiritismo de Umbanda (capitaneada por Zélio e por migrantes do Espiritismo Doutrinário ou Ortodoxa, e do Esoterismo que acabou encontrando lugar no que é conhecido como Umbanda Esotérica, a qual engloba várias vertentes, em que se destacou o trabalho de Betiol, Emanuel Zespo e WW da Matta e Silva).
Em 1941, com o Primeiro Congresso de Espiritismo de Umbanda (existe uma copia digital dos Anais desse Congresso no Site do Povo de Aruanda, se não me engano), foi intencionalmente criada uma barreira altamente preconceituosa aos cultos africanistas e outros que não estivessem dentro do contexto Espírita e Esotérico. Além de se colocar no Congresso a preocupação de dar a Umbanda uma origem que foi atribuída à Lemúria e a Atlântida.
Pelo lado do Espiritismo, para não haver uma miscigenação da Doutrina Espírita com a o Espiritismo de Umbanda, e outras seitas que pudessem poluir a Doutrina Espírita, foi criado em 1949 o Pacto Áureo. Esse Pacto frustrou os Espíritas Umbandistas de assumir a Umbanda como Espiritismo de Umbanda, pois muitas das pessoas que militavam na Umbanda Branca nessa época ou eram dissidentes do Espiritismo Ortodoxo, ou permaneciam em ambos (na Umbanda Branca ou Espiritismo de Umbanda e em Casas Espíritas).
Com a criação do Pacto Áureo essas pessoas tiveram que escolher onde iriam ficar: ou no Espiritismo Doutrinário ou no Espiritismo de Umbanda ou Umbanda Branca.
Os outros cultos de Umbanda acabaram se isolando e tentaram construir Federações que os abraçassem ou se retiraram do Rio de Janeiro para outros locais, como acabou acontecendo com a Linha de Simiromba, e algumas formas de Umbanda Omolokô que acabaram dando Origem em Florianópolis no Culto de Almas e Angola.
A partir de 1950 e por diversos aspectos de discórdias e brigas, a Linha de Umbanda Esotérica também acabou se isolando do Espiritismo de Umbanda que acabou retirando o nome Espiritismo e deixando apenas o de Umbanda Branca. E isso pode ser notado no Congresso de 1961, Segundo Congresso de Umbanda.
Existe muita história sobre a Umbanda em seus vários aspectos. É um motivo de também haver muitos preconceitos que foram sendo passados de geração à geração.

Só lembrando que existia e parece que ainda existe, mas bem pouco difundido, algumas casas de Umbanda que ainda trabalham com essa linha maravilhosa cujo Mentor ou Guia, ou Dirigente Espiritual é Francisco de Assis, este espírito que é pura luz, amor e abnegação e prá nossa felicidade, duas casas remanescentes estão aqui no Rio Grande do Sul, um dos “sacerdotes” responsáveis era um tenente reformado da Marinha e cujo centro chama-se Centro de Umbanda de São Francisco de Assis, hoje quem o dirige é a irmã deste tenente pois o mesmo faleceu, senhora Núbia Martha. O outro parece ter o nome de Casa de Oração São Benedito, cujo responsável é o Sr. Marcelino Antônio, nestes dois casos as fontes consultadas não lembravam as respectivas cidades.

A Umbanda de Simiromba tem a assistência de espíritos franciscanos, e seus trabalhos são muito bonitos, eles fazem muitas preces, novenas, suplicas faladas com protetores, dizem ainda que tem origens no estado do Maranhão .
À título ainda de conhecimento, cabe salientar que a primeira Tenda Umbandista fundada pelo Zélio de Moraes, a Tenda Nossa Senhora da Piedade trabalhava com essa linha de Simiromba, inclusive numa das incorporações do Caboclo das Sete Encruzilhadas, um médium vidente questionou o Caboclo Sete o porque dele falar como um caboclo, pois via que ele usava um hábito marrom de jesuíta, ao qual ele informou estar assim vestido de acordo com sua última encarnação na terra como padre jesuíta(e como nada é por acaso...)
Eram comuns naqueles tempos os centros de Umbanda que trabalhavam na linha de Simiromba, como era o caso da Cabana de Pai Caetano, fazerem a Oração de São Francisco na abertura das giras de Caboclos.
Era uma gira abençoada, conforme relatos de pessoas que conhecem esse trabalho.
Deixo abaixo, estrofes de pontos cantados nas sessões de Simiromba:


Simiromba vem Simiromba
Com a cruz na mão Simiromba
Como ele vem contente, Simiromba
Trazendo a sua redenção, Simiromba
Bate, bate, bate, bate, Simiromba
Ora tornas a bater, Simiromba

Para concluir tão belo conhecimento deixo depoimento de uma senhora do Rio de Janeiro, chamada Márcia e que faz parte do meio Umbandista e cujo depoimento sobre a Linha de Simiromba é impar:


MÃE MÁRCIA D'OYA


Iniciei-me na Umbanda nos anos 60 e conheci pelo menos 4 centros aqui no Rio de Janeiro, que trabalhavam com a linha de Simiromba:
O primeiro era da Mãe Carmen, ficava no Encantado; o outro era da Mãe Guiomar Reis, no Sampaio, que foi quem me iniciou na Umbanda, chamado Casa da Vovó Maria Conga, terceiro era o terreiro de Mãe Dalila que ficava na Rua Barão dos Santos Anjos, no Engenho de Dentro, e ainda, a Cabana de Pai Caetano que era de meu avô carnal.

Na casa de meu avô, Pai Maurício, Simiromba era uma linha de trabalho chefiada por São Francisco de Assis. Eram freis e freiras que trabalhavam principalmente com cura. Eram invocados dentro da linha de São Sebastião (Oxossi).
Minha avó, Mãe Marina, trabalhava nesta linha com um Frei, que sempre fazia os casamentos da casa. Este frei, quando incorporado, durante estas cerimônias, transformava 2 pétalas de rosas brancas em hóstias que eram dadas aos noivos como se fosse uma comunhão. Vestia-se com uma túnica branca com uma cruz azul bordada no peito.

Ao ouvirem "Salve Simiromba", os atabaques rufavam, se havia Caboclos em terra, estes se ajoelhavam para seus cânticos e assim permaneciam até que esta entidade chegasse.

Seu ponto de chamada era cantado lentamente:



Salve Simiromba!

Ê, Simiromba â.
Vem, vem, vem, Simiromba!
Simiromba, vem â Simiromba
Vem, vem, vem, Simiroba,
Ele vem com a cruz na mão, Simiromba.
Ê, Simiromba â¦
Vem, vem, vem, Simiromba!
Vem abençoar a gente, Simiromba
Ê, Simiromba!
Vem pelas mãos de Deus, Simiromba.
Ê Simiromba â¦.
Vem, vem, vem, Simiromba!
Lembro-me de mais um ponto que era cantado enquanto éramos abençoados:

Se meus olhos não me enganam,
É São Francisco, Simiromba â¦.
Me abençoa, meu Pai.
No raio do amor
No raio da Luz!
Se meus olhos não me enganam,
É São Francisco, Simiromba â¦
Me abençoa, meu Pai,
No amor de Maria com a sua cruz!
Tenho em meu acervo foto de minha avó, Mãe Marina, incorporada com este frei franciscano. (Segue abaixo )


Para realizar esta pesquisa contei com pesquisas em livros e sites da Internet e da preciosa ajuda dos Irmãos do Grupo Povo de Aruanda, em conteúdos e depoimentos, são eles: Etiene Sales, Alex de Oxóssi, Pai Leo de Ogum e a nossa abnegada Mãe Márcia D'Oya.

quinta-feira, 30 de maio de 2013

APARECIDA - MITOLOGIA BRASILEIRA

                               
 
 
 
   

 

Nossa Senhora Aparecida – A madona negra brasileira


Lucy Penna, autora de Aparecida do Brasil, a Madona Negra da Abundância, explica os significados do mito de nossa senhora e conta como ele está ligado ao sagrado feminino
Andiara Maria
Foto: Arquivo pessoal
Como uma pequena imagem quebrada, encardida, pescada no rio, tornou-se a santa padroeira do País e tem sido capaz de atravessar séculos inspirando uma devoção que atrai anualmente 7 milhões de romeiros ao maior centro de peregrinação da América Latina? Em busca de respostas que ultrapassam as fronteiras da religiosidade, a psicoterapeuta junguiana Lucy Penna se entregou de corpo e alma à pesquisa do que ela considera um dos grandes mitos brasileiros: Nossa Senhora da Conceição Aparecida.Sua busca resultou no livro Aparecida do Brasil, a Madona Negra da Abundância, lançado recentemente pela Editora Paulus.
Com a emoção que move os buscadores, o olhar perspicaz da mestra e doutora em psicologia clínica, a experiência de mais de 30 anos de consultório e os conhecimentos reunidos em inúmeros estudos sobre os símbolos sagrados do feminino, Lucy seguiu os passos de Aparecida. Viajou no tempo, recompondo o cenário político, social e econômico no qual emergiu a padroeira. Seguiu o rastro da Madona Negra indo em busca de diversas manifestações do seu arquétipo. No Havaí, fez contato com Pele, a deusa dos vulcões. Na Suíça, se emocionou com a Madona de Einsiedeln, e do mesmo modo com a Madona de Czestochowa, na Polônia, e Nossa Senhora de Guadalupe, no México.
Em seu consultório em Goiânia (GO), onde vive hoje, Lucy se empolga ao revelar os muitos significados do mito de Aparecida. Os olhos de um verde profundo, normalmente tranquilos, se agitam. Os cabelos e a pele acobreados ganham ainda mais vida. Os braços da autora de Dance e Recrie o Mundo assumem gestos largos. Aparecida, ensina Lucy, nos adverte sobre a necessidade de cuidar melhor dos nossos recursos hídricos e nos indica como curar as feridas da alma coletiva brasileira e tornar mais íntegro o caráter nacional, pondo fim à corrupção e às desigualdades sociais para que tenhamos, enfim, abundância.
VOCÊ ESTUDA O FEMININO SAGRADO HÁ 31 ANOS E, EM 1996, JÁ HAVIA ABORDADO O MILAGRE DE APARECIDA EM UMA PESQUISA SOBRE AS DIVINDADES FEMININAS DO BRASIL. SEU INTERESSE PELO TEMA NASCEU ALI?
Sim, na época eu me debrucei sobre Aparecida e a questão do sagrado feminino, mas essa fase teve uma intermitência, logo eu já estava estudando outros temas. Conscientemente não estava ligada em Aparecida. O que me levou de volta a ela foram algumas viagens. No Havaí, por exemplo, tomei contato com a Pele, a deusa dos vulcões. Era uma completa novidade para mim. Foi algo que ficou no meu inconsciente fazendo uma teia. Mais tarde, na Inglaterra, comprei vários livros, entre eles A Madona Negra, de Ean Begg. Ele teve todas as profissões do mundo e, já no fim da vida, foi fazer um curso de formação junguiana e se interessou pelo assunto. Ele levantou 450 Madonas Negras cristãs, no eixo da Europa e dos países de língua inglesa. No livro dele há um trecho sobre Aparecida e, quando percebi, estava profundamente atraída pela figura da Nossa Senhora Aparecida do Brasil, sendo que eu não era devota.
ISSO MOTIVOU SUA PESQUISA?

Não. Eu já morava em Goiânia e, quatro anos atrás, de repente, acordei pensando em Aparecida, me senti motivada a me debruçar sobre ela e comecei a pesquisa.

VOCÊ TRATA APARECIDA COMO UM MITO BRASILEIRO. O QUE CONFERE A ELA ESSE CARÁTER?
O mito é um sonho coletivo e o Brasil sonhou com a Madona Negra, que apareceu e foi chamada Aparecida.
SONHOU COMO? Ela é uma cocriação nossa, porque os outros fatores são mistério, fazem parte do mistério. Por que ela é um sonho nosso? Tentei entender isso levando em conta as condições sociais, históricas e antropológicas que faziam parte da psique das pessoas naquela hora. Qual era o estresse, o anseio e o sofrimento delas, qual era aquela condição que daria, em termos da psique, a descoberta de uma fonte de misericórdia, de uma fonte de alívio e de proteção. Elas eram totalmente deserdadas ali, e não só os escravos. Todos estavam abandonados pelos órgãos públicos.
TODOS SABEM QUE APARECIDA FOI PESCADA AOS PEDAÇOS NO RIO PARAÍBA, MAS POUCA GENTE CONHECE OS DETALHES DA HISTÓRIA. Os pescadores estavam angustiados, porque eram considerados bons a ponto de receber a encomenda de pescar parte do banquete em homenagem ao conde de Assumar, o novo governador da província de São Paulo e Minas Gerais, que passava pela Vila de Guaratinguetá, com uma comitiva de quase 500 pessoas. Você imagina, tinha de ter muito peixe. Eles passaram a noite pescando. Navegaram pelo rio e não pescaram nada. Mas João Alves, seu pai, Domingos, e seu tio Felipe não desistiram, apesar do cansaço. O rapaz foi quem apanhou primeiro o pedaço do corpo e, depois, a cabeça. Isso sempre me intrigou. Como é que a água do rio está passando e vem um pedacinho da cabeça da santa? O que é isso? De onde vem? Isso é um mistério. E esse é o lado do mistério que acho apaixonante.
EXISTE AINDA O DETALHE DE QUE, DEPOIS QUE ELE ENCONTROU A SANTA, A PESCA FOI ABUNDANTE. Esse é o milagre.
Foto: Anderson Cattai

QUAL É O SIMBOLISMO DESSA HISTÓRIA: UM PESCADOR JOGA A REDE E PESCA O CORPO E, DEPOIS, A CABEÇA DE UMA IMAGEM, NUM RIO CAUDALOSO. AO UNIR AS DUAS PARTES, PERCEBE QUE É UMA NOSSA SENHORA NEGRA… O simbolismo pode ser visto em vários níveis. Naquela hora, ela foi identificada como uma santa católica. Eles não sabiam qual era a Nossa Senhora e a chamaram Aparecida. Aparece, Aparecida! Não havia esse nome no Brasil nem registro civil de alguma mulher batizada com esse nome. Também não era nenhuma santa de igreja até aquele momento. Então ocorreu a circunstância, a ânsia de eles acreditarem no milagre para salvar sua sobrevivência. Foi nessa condição que nasceu o mito. O mito se torna um sonho coletivo, mas na sua origem pode ter ocorrido com um grupo pequeno de pessoas ou, às vezes, uma pessoa que teve uma experiência que a gente conhece como sendo o encontro com o mistério, uma experiência luminosa, como quem pensa: “Hum, entendi! Pesquei uma santa quebrada, mas é uma santa e ela vai nos ajudar.” Aí vem o mistério, a rede cheia de peixes. E a conjuntura começa a sair do controle racional, porque várias pessoas se aproximam daquele evento e dizem: “Aqui tem um toque de mistério. Vamos rezar, vamos pedir.”
SURGE UMA SANTA NEGRA, NUM PAÍS ONDE REINAVA A ESCRAVIDÃO, E, DE REPENTE, TODOS COMEÇAM A CULTUAR A IMAGEM.
Mas eram os negros, os mamelucos, os indígenas e os mulatos que estavam com ela. Demorou dez anos para que o pároco da cidade se interessasse. E temos de perguntar: por que essa história não acabou? Por que não foi sufocada e, apesar dos ataques que ainda sofre, por que a crença se espalhou pelo Brasil inteiro? Diante de um mito, é preciso avaliar o contexto histórico. Ele pega uma amplitude da psique coletiva, portanto, da cultura daquele momento, e não só daquele local, mas da cultura do país. A partir disso, passa a ser vivido pelas pessoas como se fosse um ser vivo que respira com elas. Assim, Aparecida vai se tornando padroeira daquele lugar, padroeira do Brasil. Ela está dentro de nós e, ao mesmo tempo, é um ser psíquico que extrapola as nossas mentes, porque senão teria morrido quando acabou aquela geração que viveu a escravidão. Nós estamos a três séculos disso!
VOCÊ DEFENDE A TESE DE QUE APARECIDA É UMA MANIFESTAÇÃO DO ARQUÉTIPO DA MADONA NEGRA. COMO FUNCIONA ESSE ARQUÉTIPO QUE SE MANIFESTA TANTO EM UM PAÍS MESTIÇO, COMO O BRASIL, QUANTO EM PAÍSES DE RAÇA CAUCASIANA?

É assim mesmo, estranho. O impacto que tive na Suíça ao conhecer a Abadia da Madona Negra de Einsiedeln foi enorme. O local é um centro de peregrinação que inspira a devoção de católicos e até mesmo de protestantes. Lá, você mergulha num simbolismo mais profundo que ultrapassa a cor da pele, aqui no Brasil bastante vinculada à escravidão. Percebe que esse negro é também a noite de onde emerge tudo o que é criado. Dentro de uma amplificação possível nessas condições, esse é o negro do útero da terra. As Madonas Negras têm uma relação muito interessante com Gaia, com a própria Terra, com o próprio planeta. Essa imagem do feminino parindo tudo. A Madona Negra é uma formulação da Grande Mãe Terra.
"A nação é como o corpo de um ser e o governo deveria ser a cabeça, capaz de organizar. no Brasil, no momento, eu vejo uma sepa ração impressionante"
O QUE AS MADONAS NEGRAS TÊM EM COMUM, ALÉM DA COR?
A Madona Negra traz uma espécie de conteúdo encontrado inclusive em madonas anteriores ao cristianismo, no sentido da relação com nossos instintos básicos; portanto, da relação com a sobrevivência, da relação com a criação, com a fertilidade do planeta e da mulher. E, numa forma mais ampla, com a criatividade, com a capacidade de inventar, de se criar maneiras não apenas de sobreviver, mas também de evoluir. Há uma circunstância muito interessante nos lugares mais pesquisados por mim, como a Polônia, a Suíça, o México e o Havaí: a crise social de identidade daqueles povos. Nesses momentos de crise social, se ela não emergiu, emerge. E, quando emerge com essa força telúrica, ela representa a capacidade do povo de se reorganizar e lutar pela própria identidade. Há uma crise de identidade ameaçando a constituição do povo.
QUAL ERA A CRISE QUE O BRASIL ATRAVESSAVA QUANDO A SANTA FOI ENCONTRADA?
A nossa mestiçagem. Há um dado que acho importante: ela não caiu negra no rio, mas colorida. Era policromada e teria ficado tanto tempo dentro do rio a ponto de embeber-se de uma mistura de lodo. A Maria Helena Chartuni (a artista plástica que restaurou a imagem da santa depois que ela foi roubada e quebrada, em 1978) me disse: “Lucy, os resquícios de cor estavam dentro de alguns dos fragmentos que me trouxeram.” Antes se imaginava que alguém a tivesse esculpido negra para significar que era a Nossa Senhora dos escravos. Aí entra mais uma dose de mistério, porque foi a água do rio que a deixou negra.
ESTÁ CLARO QUE APARECIDA É UMA METÁFORA DA ALMA NEGRA DO BRASIL. MAS, ALÉM DISSO, EXISTE O FATO DE QUE ELA EMERGE DAS ÁGUAS, ASSIM COMO OUTRAS DIVINDADES FEMININAS BRASILEIRAS. Em Aparecida, o que me chama a atenção é que ela emerge do rio e, aos poucos, descubro que ela foi cocriada pelo rio. Aqui já se tem uma condição que surge com a água, a água criando a imagem de Aparecida como nós a conhecemos. E isso dentro de um rio que se tornou de grande importância econômica e social para aquela região. Pela nossa grande abundância de água, temos madonas brasileiras envolvidas com os rios e com o mar, de norte a sul. A qualidade da interação que nós temos com as águas é que precisa agora receber uma atenção mais cuidadosa. As águas falam para a nossa psique, se comunicam conosco no nível subliminar. São poderosas. Aparecida emerge do rio para nos mostrar que a água não é silenciosa e, como a nossa psicologia está voltada para esse feminino das águas, ela representa a maternidade das águas. As águas vivas nos têm e vão nos parindo o tempo inteiro. Uma das fontes para essa minha compreensão da parição das águas (parição, não aparição!) é o mito disseminado na Amazônia inteira de que o povo das águas, como são chamados os indígenas, veio de uma transformação de seres que habitavam dentro dos rios.
OS ÍNDIOS CARAJÁS, DO RIO ARAGUAIA, TÊM O MESMO MITO. ANTES DE SEREM HOMENS ERAM PEIXE, O ARUANÃ. É isso!
DE CERTA FORMA, ESSA É A TEORIA CIENTÍFICA, A VIDA COMEÇOU NA ÁGUAS.
Sim. Então, você vê um dado do inconsciente coletivo universal com a vestimenta que ele tem para nós. As águas significam símbolos de uma natureza profundíssima enquanto origem, transformação e regeneração. E Aparecida resume tudo isso numa figura humanizada.
QUAL SERIA A MENSAGEM DE APARECIDA EMERGINDO DAS ÁGUAS?
Considerar a água um ser vivo. Cuidar com sabedoria dos nossos recursos hídricos.
É UMA MENSAGEM BEM ATUAL, MAS E NAQUELE MOMENTO HISTÓRICO?

Naquela hora, o que ficou mais evidente em Aparecida foi a identidade pela cor. A paixão por uma Nossa Senhora que parece a mãe negra da gente. Nessa fase ela é o ouro negro, que virou ouro preto, a grande protetora de quem buscava o ouro. Ele movia a economia na época, e, por conseguinte, o peixe, a sobrevivência. Hoje, nós não a vemos mais só assim. Vamos dando conotações diferentes para a mesma imagem.
A questão de ela ter vindo sem cabeça, por exemplo, até agora nunca foi levantada. Mas não é ao acaso que Aparecida vem com a cabeça quebrada. Eu, que trabalho em psicologia com o corpo, dentro da noção junguiana do que é uma integridade, digo: corpo e cabeça são pares de opostos.
E VOCÊDÁ VÁRIOS SIGNIFICADOS PARA ESSES PARES DE OPOSTOS.
Faço uma listinha, porque isso é muito complexo. Hoje, estamos dando uma conotação bem profunda da busca da integridade, isso quer dizer caráter, caráter íntegro.

NO MITO DE APARECIDA, CABEÇA E CORPO CORTADOS REPRESENTAM UMA FRAGMENtAÇÃO NA ALMA BRASILEIRA?

Em primeiro lugar, não entendi isso sozinha. Entendi estudando outros autores brasileiros que, de certa forma, estão aí mencionados, como o Sérgio Buarque de Holanda, o Roberto Gambini e o diplomata Meira Pena, que se debruçou sobre o povo brasileiro. Aparecida representa a divisão que nós temos entre uma herança materialmente trazida pelos europeus, no sentido de uma civilização racional e baseada na ordem e no progresso, e uma herança indígena em que a lógica era outra, a organização era outra. Os povos indígenas acreditam que tudo no universo tem alma – as pedras, as plantas, os animais, não só as pessoas – e procuram viver em consonância com esses elementos. O mundo europeu tinha perdido essa visão animista e adquirido outra, que nós caracterizamos como cristã e também científica. Não se vê a alma das coisas dentro da ciência. É essa característica que hoje parece estar como uma espécie de grande desafio, “me decifra ou eu te devoro”, dentro da nossa personalidade enquanto povo. Ou seja, nós vamos ter progresso e ordem neste país sacrificando totalmente o outro lado, o lado que reverencia e respeita a natureza, curte essa natureza exuberante do País, o lado que gosta da sexualidade, gosta de festa?

MAS VOCÊ TAMBÉM ANALISA A DIVISÃO ENTRE CABEÇA E CORPO EM UM CONTEXTO BEM POLÍTICO.
Cabeça enquanto governo, corpo enquanto nação. Realmente, a nação é como o corpo de um ser e o governo deveria ser a cabeça, capaz de organizar. Mas no Brasil, no momento, eu vejo uma separação impressionante. A abundância só vai acontecer quando o corpo e a cabeça estiverem unidos.
CABEÇA E CORPO CONTINUAM SEPARADOS COMO HÁ 300 ANOS?

Sim! Digo que o Imposto de Renda hoje é uma continuação piorada do quinto que o conde de Assumar veio cobrar aqui. Aliás, é até maior, não é nem um quinto, é um terço, se não for mais. E a gente não sabe para onde vai o dinheiro. Então, o corpo e a nação de um lado e o governo e a cabeça de outro continuam tão afastados quanto no tempo do Brasil Colônia. É preciso assumir: “Tenho cabeça e corpo, então eu vou me administrar.” No plano da democracia, não é mais admissível dúvida, nós temos de nos governar. Cada um de nós. Essa associação provoca dois tipos de comportamento que tento caracterizar: 1º) “Não confio no governo.” 2º) “Digo que não confio, mas, se puder, quero estar lá e, quando estiver, esqueço tudo o que ficou lá trás.” As dificuldades que enfrentamos como povo, como nação, de dar às coisas começo, meio e fim, fazer projetos e terminá-los são tão grandes que me levam a dizer: “Puxa vida, Aparecida daqui a pouco vai sofrer outro ataque, vai se despedaçar toda.” Porque ela está representando o despedaçamento dentro de nós.
VOCÊ TOCOU EM UM PONTO INTERESSANTE: ESSA IMAGEM JÁ FOI VÍTIMA DE VANDALISMO DUAS VEZES. POR QUÊ?

Muito mais. Só se fala de dois ataques porque foram mais bem documentados. É a mesma coisa que acontece quando, por exemplo, eu estou vivendo uma crise, passando uma situação difícil e aí tropeço na rua e torço o tornozelo, quebro uma perna. Seria um momento para eu parar e refletir um pouco. Como é que estou andando? Para onde estou indo? Como pessoa, isso é possível, mas, como povo, precisamos nos educar, falar e discutir muito e encontrar maneiras comuns de compreensão. Isso, enquanto o corpo de uma nação precisa de educação, e muita educação. Conhecimento.
DE ACORDO COM O MITÓLOGO NORTE-AMERICANO JOSEPH CAMPBELL, QUE VOCÊ CITA NO LIVRO, O MITO TEM QUATRO FUNÇÕES: ESPIRITUAL, FILOSÓFICA, SOCIOLÓGICA E PEDAGÓGICA. QUAIS SERIAM ELAS NO CASO DE APARECIDA?

A função pedagógica do mito diz o seguinte: enquanto você tiver a cabeça separada do corpo, você não tem fartura na vida. Cabeça significando capacidade de organização, previsão de recursos, planejamento, direção de vida. O corpo significando a força de trabalho, a alegria de viver e o gosto de saber que eu estou fazendo porque gosto de estar com as pessoas na fartura, na abundância. Alegria! Principalmente alegria de viver, e a sexualidade está dentro disso.
Já a função sociológica, mais ligada à cor de Aparecida, significa: precisamos aceitar de verdade a nossa morenice. Aparecida aponta para o perigo da dissociação coletiva por conta da discriminação. Nós temos sim, dentro de nós, uma inaceitação da nossa morenice. Somos um povo marrom! De várias tonalidades, do escuro ao ocre dourado. Então, essa já é uma questão ligada com a nossa sociologia e, portanto, com a evolução de indígenas e de descendentes afros na sociedade galgando postos, como Marina Silva, descendente negra dentro de uma candidatura à Presidência.
E A FUNÇÃO ESPIRITUAL?
Para mim, ela significa um alcance metafísico no seguinte sentido: a relação do feminino é a relação da escuta do mistério, da escuta mais atenta de poderes transcendentes que atuam nesse planeta, atuam no Sistema Solar e em outras esferas maiores que nós, seres humanos; comunicam com ondas magnéticas, e outras ondas que ainda não descobrimos, informações importantíssimas para que saibamos quem somos, de onde viemos e para onde vamos.
O feminino é capaz de abrir, acolher esse tipo de informação ainda não decifrado. Ele se traduz por essa qualidade da alma humana de poder, sejamos homens ou mulheres, receber uma informação que não decodificamos imediatamente no racional, mas sentimos que ela nos transforma.
"A gente deve parar de estudar deusas gregas, romanas e não sei mais das quantas e passar a estudar os nossos mitos, que são extremamente valiosos"
O feminino no mundo, como abordagem do real, é essa abordagem que torna o visível e o invisível comunicantes. Primeiro, aceita o invisível como real também. Por que real? Porque me atinge, me modifica, me comove e me estimula. A função espiritual do mito Aparecida é a aceitação de um feminino sagrado que, neste país, fala em todos os recantos, simbolizando a integração necessária para a evolução da consciência coletiva do Brasil, no sentido de maior igualdade, solidariedade e criatividade.
E O MITO ATUA NA PSIQUE COLETIVA INDEPENDENTEmen te DA COMPREENSÃO QUE SE TEM DELE?

Ele atua tão forte na psique inconsciente da maior parte das pessoas que o mito Aparecida permanece vivo até hoje. Agora, cutucando meus colegas psicólogos, nós estamos no Brasil tentando formar a nossa cabeça, estudando mitos que foram vivos para povos do outro lado do mundo. Formidável! Fantástico! Já fiz esse caminho. Mas é preciso outro esquema para entender quem somos nós aqui, onde estamos. A gente deve parar de estudar deusas gregas, romanas e não sei mais das quantas e passar a estudar os nossos mitos, que são extremamente valiosos.
Prestaríamos um serviço de utilidade pública. Porque isso representa uma terapia socializada, vamos dizer assim. Temos de nos apoiar nos mitos da nossa gente. Eu cito o Macunaíma, mas há muitos outros que representam essa criação das questões da nossa psique, como os sonhos coletivos de grupos. E o que são sonhos coletivos? Estão representando o quê? Os nossos anseios frustrados, a nossa sombra, que são nossas dificuldades, como encostar o corpo, ser meio malandrinho, preguiçoso e assim por diante. É preciso que a gente se valorize. Nós criamos esses mitos.
POR FIM, COMO UMA IMAGEM TÃO PEQUENININHA TEM TAMANHA FORÇA? VOCÊ JÁ ENCONTROU A RESPOSTA?
Tem um mistério. Nós nos debruçamos sobre o mistério não para obter respostas, mas para fazer outras perguntas.
Fonte: Revista Planeta – http://www.terra.com.br/revistaplaneta/